segunda-feira, julho 25, 2011

NASSAR e a galáxia de Marshall McLuhan











Neste ano de 2011, Herbert Marshall McLuhan (1911-1980) completaria cem anos. A efeméride será comemorada em São Paulo, no Teatro Vivo, nos dias 2 e 3 de maio, a partir das 9h00, com o seminário “O Século McLuhan”, promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (PPGCOM/ECA/USP), pelo Centro de Pesquisa ATOPOS e pela Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (ABERJE). O encontro reunirá professores e comunicadores para debaterem a obra do pensador canadense. Entre eles, Derrick de Kerckhove, ex-diretor do McLuhan Program in Culture & Technology, Décio Pignatari e Maria Immacolata Vassallo de Lopes, coordenadora do PPGCOM/ECA/USP.












O meio é a massagem



Os livros de McLuhan mais conhecidos são a “A Galáxia de Gutenberg”, de 1962, “Os Meios de Comunicação Como Extensões do Homem - Understanding Media”, de 1964, traduzido no Brasil pelo poeta Décio Pignatari, e o “O Meio é a Massagem”¹, de 1967, que tem como co-autor o artista gráfico Quentin Fiore e que é um manifesto repleto de provocações e um inventário ilustrado dos efeitos da comunicação eletrônica sobre os indivíduos, empresas, instituições e governos.

 

Em uma de suas páginas, o livro “O Meio é a Massagem” traz como título, em negrito, a palavra “Você”, ilustrado com um redemoinho, ao lado da impactante afirmação de McLuhan de que as formas de pensar, criar, operar, controlar e viver das tecnologias mecânicas de comunicação estavam seriamente ameaçadas pelas tecnologias, pelo modo de criar e fazer, armazenar, criar e armazenar as informações elétricas. McLuhan e Quentin Fiore refletiram, há mais de 50 anos, sobre a gestão do ambiente da comunicação baseada em computadores e o que poderia decorrer disso. Por exemplo, os meios de comunicação como protagonistas importantes de inovações, crises e revoluções - de inúmeras abrangências e impactos - nos campos culturais, econômicos, sociais, ambientais, políticos, educacionais e da psique da sociedade. E, profeticamente, o surgimento das grandes economias asiáticas, como a japonesa e a chinesa (“The west shall shake the east awake...while ye have the night for morn...”) 







E-comerce e Tribalização



Na atualidade, os circuitos, os computadores, as conexões elétricas e instantâneas transformaram situações do cotidiano, quando os jovens urbanos usam e abusam do uso dos celulares e das redes sociais para se tribalizar e questionar o poder do pai, do professor, do padre, do patrão e do pai de santo ou, ainda, nos cafundós dos extremos do mundo, nas franjas do mediterrâneo e no interior da África expor e derrubar ditaduras tidas como eternas. O Wikileaks e a indelével memória digital são frutos singulares do que McLuhan denominou era da informação eletrônica.  E, também, a criação artística e a pesquisa acadêmica democratizadas, em termos de suas produções e divulgações, pela disponibilização de softwares gratuitos ou de baixo custo e compartilhamento de experiências e informações no âmbito de comunidades de artistas, pesquisadores e interessados, que não dependem mais de financiamentos, museus e curadorias para existirem e se afirmarem. No mundo empresarial, a revolução eletrônica se consolida com o comércio digital, com a e-comunicação empresarial e as ações de educação e treinamento, renovadas com as possibilidades da co-criação, das novas narrativas como o storytelling e a memória institucional, as produções audiovisuais de baixo custo e da educação à distância.








Ideias que permanecem.



Após 50 anos, as idéias de McLuhan têm uma sintonia com a idéia ecológica de que todos, independentemente de suas posições na hierarquia, tamanho de conta bancária, formação educacional e ideologia fazem parte de um mesmo mundo, integrados eletricamente, digitalmente, em uma “aldeia global”.  As nossas ações privadas ou públicas afetam a todos. A comunicação e os seus meios criam uma noosfera, idéia do padre jesuíta francês Teilhard de Chardin (1881-1955), que influenciou McLuhan a pensar a aldeia global tecida por circuitos eletrônicos. Para Chardin, além do mundo natural integrado, convivemos com um mundo ou esfera constituída pela cultura e pelos conhecimentos, a noosfera.  Outra idéia mcluhiana a de que “todos os meios são extensões de alguma faculdade psíquica ou física humana” nos integra também com aquilo que criamos e que constituem as nossas extensões, o pós-humano, as ferramentas, os processos tecnológicos, as máquinas. Em “O Meio é a Massagem”, McLuhan explica didaticamente o seu pensamento sobre as extensões: “A roda é uma extensão do pé”; “O livro é uma extensão do olho”; “A roupa é uma extensão da pele”; “O circuito elétrico é uma extensão do sistema nervoso central”.



A obra de McLuhan, aparentemente didática, é coalhada de aforismos. “O meio é a mensagem” é o mais conhecido de seus aforismos. Outros são igualmente provocadores: “A nova interdependência eletrônica recria o mundo à imagem de uma aldeia global”; “O amanhã é o nosso endereço permanente”; “Não há passageiros na espaçonave Terra. Somos todos tripulação”; “Todas as extensões de nossos corpos, inclusive as cidades – traduzem-se em sistemas de informação”; “Hoje cada um de nós vive centenas de anos em uma década”; “É o quadro que muda a cada nova tecnologia e não apenas a imagem dentro da moldura”; “Notícias, mais do que arte, são artefatos”. Todas as mesas temáticas do seminário “O Século McLuhan” foram inspiradas pelos aforismos de McLuhan citados, que deverão ser debatidos pelos pesquisadores e profissionais convidados. Um desafio e tanto.






McLuhan parecia saber que o aforismo deve ser escrito para o futuro, para ser compreendido, se isso é possível, no longo prazo.  É como o fogo pequeno que arde eternamente escondido no interior do vulcão aparentemente extinto.  A imprecisão aparente que é essencial nos bons aforismos é defendida por Nietzsche e Karl Kraus (1874-1936), excelentes em conceber este tipo de narrativa. Os criados por McLuhan têm a mesma linhagem dos aforismos desses mestres. E a não compreensão imediata de suas frases abertas como mitos, principalmente pelos acadêmicos de sua época, e a adesão de milhões de leitores, que transformaram algumas de suas obras em best-sellers, geraram um movimento mental que as trouxeram vivas e atuais até os nossos dias.  Marshall McLuhan vive.



¹ - Publicada em 1967, a versão original de “O meio é a mensagem” (que, em inglês, tem o título "The medium is the massage)" utiliza o termo “massage” para indicar o impacto sensorial das mídias.






ELABORADO POR: Paulo Nassar
paulo_nassar@terra.com.br
Professor da Escola de Comunicações e Artes, da Universidade de São Paulo (ECA-USP), onde ministra as disciplinas "Produção de Periódicos Institucionais", "Produção Audiovisual no Contexto das Novas Mídias, do Novo Social, e das Empresas e Instituições" e "Memória Institucional e Responsabilidade Histórica" e coordena o curso de Relações Públicas. Leciona no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu da ECA-USP e é Vice-Coordenador do curso de especialização GESTCORP - Gestão Estratégica em Comunicação Organizacional e Relações Públicas. Diretor-geral da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje). Autor de inúmeros livros, entre eles O que é Comunicação Empresarial, A Comunicação da Pequena Empresa, e Tudo é Comunicação.